Tuesday, September 04, 2007

A filosofia do iluminismo

Este texto são resumos e estudos do iluminismo. Devo minha iniciação, admiração, e o reconhecimento do Iluminismo no saber da atualidade ao organizado professor José Menezes.



A Filosofia do Iluminismo - Cassirer, Ernest.


Não consiste um conteúdo doutrinal que tenha tentado elaborar e fixar dogmaticamente.

No tocante ao conteúdo de seu pensamento permaneceu muito dependente dos séculos precedentes.

Apropriou-se da herança desses séculos. Ordenou, examinou, sistematizou, desenvolveu e esclareceu muito mais do que contribuiu com idéias originais e sua demonstração. (um novo modo de linguagem que resgata as idéias do passado e lança a base para a filosofia moderna)

O novo e original é nova forma de pensamento filosófico.


Na Inglaterra e na França – quebra o molde do conhecimento filosófico, o sistema metafísico. Então, não caberia mais a filosofia restringir-se à tarefa de deduzir verdades da cadeia de axiomas fixados. Coube aos filósofos das Luzes discutirem a forma fundamental da realidade, de toda existência, tanto natural quanto espiritual.

A filosofia não está num domínio particular do conhecimento situado acima das verdades da física, das ciências jurídicas e políticas, ou qualquer outra ciência da natureza ou humanas. Mas é o meio universal onde todas essas verdades formam-se.

O sentido verdadeiramente fecundo do pensamento iluminista: menos por um conteúdo do pensamento determinado do que pelo próprio uso que faz do pensamento filosófico, pelo lugar que lhe confere e pelas tarefas que lhe atribui.





Os filósofos costumam dar uma importância menor ao iluminismo, considerando-a apenas como “filosofia da reflexão”. Cassirer atribui a Hegel este caminho de crítica, e obviamente, pelo peso de seu nome acabou legitimando esta visão do Iluminismo.

O esforço principal da filosofia do Iluminismo não se limita a acompanhar a vida e a contemplá-la no espelho da reflexão. Mas funda-se na espontaneidade originária do pensamento, não é restringi-lo a um papel de comentar a posteriori e de refletir, mas o poder e o papel de organizar a vida. (Ora, quem começa a inserir o discurso sexual dentro da seara do pensamento filosófico de forma sistematizada, atribuindo poder de causa e de ordem social, é o Iluminismo. Anterior a isso era uma literatura erotizada, que tinha mais o efeito de quebra de tabus do que explicações filosóficas e científicas, mas estas literaturas foram fonte de inspiração para os Iluministas)


O Iluminismo não cabe um estudo do desenvolvimento de sistema em sistema, como é possível do século XVII. Descartes a Malbranche, de Spinoza a Leibniz, de Bacon e Hobbes a Locke. No limiar do século XVIII, este método de estudo da história da filosofia não pode ser empregado, pois carece de força de lei e representatividade.

O iluminismo não pode ser estudado por uma doxologia, ou seja, não se destaca da soma e da sucessão cronológica de opiniões. Mas sim, na arte e na forma de conduzir os debates de idéias.


I – O Pensamento da era do Iluminismo

D´Alembert traçou um painel onde procura definir a situação do espírito humano em meados do século XVIII. Assinalou antes o seguinte:

Meados do século XV inicia-se o movimento literário e intelectual da Renascença..
Meados do século XVI, a Reforma religiosa está no apogeu.
Meados do século XVII é a vitória da filosofia cartesiana que provoca uma revolução radical na imagem do mundo.

Texto na íntegra de D´Alembert – leiam no livro.


Sobre o texto:
Aborda o mundo com a nova alegria de descobrir e com um novo espírito de descoberta. O pensamento sente-se ainda mais profundamente conquistado, mais apaixonadamente comovido por uma outra questão: a de sua própria natureza e do seu próprio poder.

É uma época que sente uma nova força atuando e que está menos fascinada pelas criações incessantes desta força do que pelo seu modo de ação.

Quando o século XVIII quer designar essa força, sintetizar numa palavra a sua natureza, recorre ao nome de Razão.

A “razão” é o ponto de encontro e o centro de expansão do século, de seu querer e de suas realizações. O século XVIII está impregnado de fé na unidade e imutabilidade da razão.

A razão é uma e idêntica para todo o indivíduo pensante, para toda a nação, toda a época, toda a cultura.

A expressão “Razão” ou racionalismo têm pouco peso, mesmo no sentido de uma característica puramente histórica. Vamos decompor um pouco este termo, dando sua importância entre os Iluministas, que se auto titulavam “século da Luzes”. Qual diferença específica da Razão?

De imediato é uma diferença negativa. O século XVII via na construção de “sistemas filosóficos” a tarefa própria do conhecimento filosófico. Então era preciso que o saber tivesse alcançado e estabelecido com firmeza a idéia primordial de um ser supremo e de uma certeza suprema intuitivamente apreendida, e que tivesse transmitido a luz dessa certeza a todo o ser e a todo o saber dela deduzido. (...) A única explicação de que é suscetível consiste em sua “dedução” rigorosa e sistemática, a qual o reconduz à causa primeira do ser e da certeza, permitindo assim avaliar a distância a que se encontra em relação a essa causa primeira e ao número de elos intermediários que o separam daquela. (p.24)

O século XVIII renuncia a esta forma de “dedução”, de derivação e explicação sistemática. Busca uma outra concepção da verdade e da filosofia, uma forma dotada de mais liberdade e mobilidade, mais concreta e mais viva. Em vez do Discurso do Método de Descartes, apóia-se nas Regulae philosophandi de Newton para resolver o problema central de método.

Não é vida dedução pura, mas a da análise. Newton não começa por definir certos princípios, certos conceitos e axiomas universais, a fim de percorrer passo a passo, por meio de raciocínios abstratos, o caminho que leva ao conhecimento do particular. É na direção inversa que se move seu pensamento: o verdadeiro método da física jamais poderá consistir em partir de algum dado arbitrariamente admitido, de uma “hipótese”. O newtonismo não pressupõe, como objeto e condição inviolável da investigação, senão a ordem e a legalidade perfeita da realidade empírica. Entretanto, essa legalidade significa que os fatos, como tais, não são um material simples, uma incoerente massa de detalhes, mas que se pode demonstrar, nos fatos e pelos fatos, a existência de uma forma que os penetra e os une. Essa forma apresenta-se como matematicamente determinada, estruturada e articulada segundo o número e a medida. Mas é justamente essa articulação que não pode ser objeto de antecipação conceptual, ela deve ser encontrada e demonstrada nos fatos. A compreensão da ordem e da legalidade empíricas.

Paradigma metódico da física newtoniana foi generalizada, como o instrumento necessário e indispensável de todo o pensamento em geral. Não cabe afirmar que há uma disputa entre a metafísica e a física newtoniana. Ao contrário, o verdadeiro método da metafísica harmoniza-se, basicamente, com o que foi introduzido por Newton na física. Não se busque, portanto, a ordem, a legalidade, a “razão”, como uma regra “anterior” aos fenômenos, concebível e exprimível e a priori: que se demonstre a razão nos próprios fenômenos como a forma de sua ligação interna e de seu encadeamento imanente (independe de uma ação exterior). Contudo é preciso reconhecer o limite de suas faculdades, e fazer uso do método analítico. “Mas temos que dizer: façamos exatamente a análise das coisas. Sempre que nos é impossível ter a ajuda da bússola da matemática e do farol da experiência e da física para guiar o nosso rumo, é mais do que certo que não –podemos avançar um só passo” (Voltaire, Tratado de metafísica, cap. V, citado por Cassirer cap. 1).

Outra diferença específica da mudança de significação característica que a idéia de razão sofreu em relação ao pensamento do século XVII.
Para os grandes sistemas metafísicos seiscentistas, para Descartes e Malebranche, para Spinoza e Leibniz, a razão é a região das “verdades eternas”, essas verdades que são comuns ao espírito humano e ao espírito divino. O que conhecemos e do que nos apercebemos à luz da razão é “em Deus”. Cada ato da razão nos assegura de participar da essência divina.

O Século XVIII confere um sentido mais modesto. Deixou de ser a soma de idéias inata, anterior a toda experiência, que nos revela a essência absoluta das coisas. A razão define-se menos como uma possessão (posse atribuída pelo poder divino) do que uma aquisição (um esforço terreno para se chegar a verdade, humano, por isso falível). Uma energia, uma força que só pode ser plenamente concebida em sua ação e em seus efeitos. A razão é uma operação para assegurar-se da verdade. A razão desmonta as crenças baseadas no testemunho da revelação, da tradição, da autoridade; só descansa depois que desmontou peça por peça, até seus últimos elementos e seus últimos motivos. Depois impõe uma tarefa construtiva. É mediante esse duplo movimento intelectual que a idéia de razão se concretiza plenamente: não como a idéia de um ser, mas como a de um fazer.

* Diversos domínio da cultura do século XVIII:

- sede de saber inscrita na substância da alma humana. O retorno da libido sciendi, a dogmática teológica tinha banido, era uma vergonha, um orgulho intelectual (até hoje, temos um pouco disso disseminado na nossa sociedade, das pessoas que pretende o caminho do saber. Na nossa sociedade o intelectual é desvalorizado, a favor do homem de posse), o século XVIII colocou como uma qualidade necessária da alma e como tal restabelecida em seus direitos naturais.

- Vamos ver na Enciclopédia francesa, retratada como o “Espírito do século XVIII”[1]. Este empreendimento polêmico levou Diderot a ser convidado pelas autoridades políticas e religiosas, amiúde, a passar algum tempo na prisão. Evento que não desanimou o seu espírito insurgente. A Enciclopédia negava os princípios religiosos e políticos da época, em busca de uma racionalidade do mundo, permitindo, assim, uma visão crítica e inovadora. que não se pretendia ser um acervo do conhecimento, mas provocar um novo modo de pensar.

-Tinham uma empolgação uma efervescência geral pelas forças em ação. Desejavam compreender e domina esta força. Assim, o primeiro passo foi determinar os limites do espírito matemático e o do espírito filosófico (determinação que não surgiu sem ambigüidades).
* Algumas aplicações do análise do espírito geométrico, antes aplicada ao espírito do número e da grandeza:

A análise no plano do psíquico e no plano social. Um método da relação analítica e da reconstrução sintética.

Dentro do plano psíquico este método parece incompatível pela diversidade de formas do conteúdo psíquico. Só que esta heterogeneidade é apenas aparente para o espírito do século XVIII. É tarefa da ciência trazer estes aspectos que escapam a um contado imediato. As formas psíquicas são passadas para as fontes e princípios. O grande mestre e guia da psicologia do Século XVIII é Locke, vai expor duas fontes diferentes de vida mental: sensação e reflexão. A par dos simples dados da visão, da audição, do tato, da cinestesia, do paladar e do olfato, Locke deixou subsistir, como totalidades originais e irredutíveis, as diversas classes de atividades psíquicas: a atenção e a comparação, o discernimento e a combinação, o desejo e a volição.

A existência do Estado e da sociedade, realidade que nasce o homem, e que exige que se adapte as novas formas já existentes. A faculdade de pensar, assim que despertada no homem, fá-lo erguer-se incansavelmente contra essa espécie de realidade. A sociedade é intimida a comparecer perante o tribunal da razão.
A vontade geral do Estado como se fosse constituída de vontades particulares, como se fosse nascida da união. Divisão em partes componentes (obedecendo ao mesmo método). Por metáfora o Estado passa a ser considerado um corpo, para que possa ser aplicado as mesmas regras que se aplica ao conhecimento da natureza dos corpos físicos.

Então, o caminho pelo qual o pensamento deve enveredar conduz, portanto, seja em física como em psicologia e em política, do particular para o geral, processo que, no entanto, seria impossível se todo o particular como tal não estivesse já submetido a uma regra universal.


Sérgio Paulo Rouanet.

O Iluminismo seria uma tendência que atravessa as épocas, não limitada a nenhum período específico, que se caracteriza por uma atitude racional e crítica. Ela combate o mito e o poder, usando a razão como instrumento de dissolução do existente e de construção de uma nova realidade.



Referência:

CASSIRRER, Ernest. A Filosofia do Iluminismo. Tradução Álvaro Cabral. 2ª edição. Campinas, São Paulo: Editora da Unicamp, 1994.
[1] GUINSBURG, J. A Filosofia de Diderot. Introdução, seleção e tradução de textos e notas por J.Guinsburg. São Paulo: Ed.Cultrix, 1966.

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